segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Os desafios da presidenta Dilma


"Brasilia e a engrenagem"

Por Delfim Neto, em Carta Capital

Antes de lembrar os inegáveis sucessos desses dois anos de governo da presidenta Dilma Rousseff na administração dos problemas da economia, decidi entrar direto na discussão do que me parece o maior desafio que ela terá de enfrentar (e vencer) nos dois anos que começam hoje, janeiro de 2013. O Brasil precisa aumentar fortemente o ritmo dos investimentos para voltar a crescer 5% ao ano, o que vai acontecer quando funcionar a engrenagem fundamental que move todo o sistema das economias de mercado, a confiança que deve existir entre o setor privado e o Estado.

Os investimentos retornarão quando se reforçar nos empreendedores a certeza de que serão tratados com justiça, com regras de jogo amigáveis aos mercados, claras e definitivas e com a garantia de que haverá respeito rigoroso à estabilidade dos contratos. De um lado, é vital que o setor privado entenda as dramáticas dificuldades que cercam a administração do Estado, aceitando o fato de que o poder incumbente é o regulador dos mercados para aumentar a competição num ambiente favorável aos negócios. Por sua vez, a administração do Estado deve manobrar com inteligência e paciência e obter a cooperação do setor privado para a realização de seus objetivos.

Nesses dois primeiros anos, desde a posse em janeiro de 2011, a presidenta Dilma Rousseff enfrentou e venceu outros graves desafios que pareciam insuperáveis, o maior deles uma elevadíssima taxa de juros que se eternizava. Administrado com extrema competência, o Banco Central comandou um sofisticado e cauteloso processo de redução dos juros, sustentado na mais alta instância política pela atenção direta da presidenta Dilma, até trazer o juro básico ao nível mais civilizado de 7,25%, em 12 meses. Isso depois de 15 anos de prática da mais alta taxa de juros do mundo, que alimentou uma sobrevalorização cambial, causando enormes prejuízos à manufatura nacional.

É de justiça reconhecer que, no exercício da política monetária, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, mostrou-se muito mais antenado com a realidade brasileira e com a situação da economia mundial do que a maioria dos nossos “especialistas” do mercado financeiro e das próprias autoridades monetárias dos países ditos “centrais”. A redução da taxa de juros real foi um passo muito importante que vai ter consequências sérias no futuro. Não é sem motivo que nossos mais ativos e ousados fundos de investimento estão buscando, no exterior, alternativas para a redução dos rendimentos que obtinham no Brasil.

De dezembro de 2011 a novembro de 2012, a Bolsa mexicana aumentou 15% em moeda local e 23% em dólares; a colombiana, 14% e 22%, respectivamente, enquanto a Bovespa aumentou 1,6% em reais e perdeu 10% em dólares. Isso explica “o porquê” de o Brasil ter deixado de ser o queridinho que era do mercado financeiro, quando as aplicações rendiam, aqui, 30% ao ano, em dólares, graças à soma do crescimento da Bovespa e da valorização do câmbio… Muitos ainda choram o fato de o Brasil não ser mais o pernil com farofa e ameixa oferecido nas festas neste fim de 2012 na City londrina ou em Wall Street.

O investidor nos setores de produção de bens não financeiros dá menos importância a esse fato, porque olha o mercado com “olhos mais longos” e vê um país com 200 milhões de habitantes, com renda per capita de 12 mil dólares, que, entre 2006 e 2011, cresceu à taxa anual de 3,2%, com uma inflação média de 5%, com uma sólida política fiscal (gráfico) e que recentemente foi classificado, pela Boston Consulting Group (BCG), entre 150 países, como o que melhor utilizou o crescimento econômico dos últimos seis anos para elevar o padrão de vida e o bem-estar da população (em meio à crise que continua massacrando boa parte do mundo). O resultado da consulta é explicado pela inserção no mercado de uma ampla classe média, que vai diversificar seu consumo e exigir cada vez mais qualidade dos bens e serviços no futuro. E também explica a “sustentabilidade” em alto nível do prestígio internacional (e nacional) do ex-presidente Lula e da presidenta Dilma Rousseff (gráfico: Inclusão Social das Classes C e D).

A presidenta frequenta, ainda, nestes momentos finais do Ano-Velho e início do Ano-Novo, a pedreira da questão energética e não é só no caso da renovação das concessões das usinas hidrelétricas, mas também da partição da produção no pré-sal entre os entes da Federação. O encaminhamento das discussões para as Casas do Congresso Nacional é a solução correta. Não houve quebra de contrato no caso da energia nem de outros setores. Não é justo calcular a indenização das usinas pelo valor residual contábil, como pretendem alguns estados, porque ele incorpora todos os tropeços na construção de cada uma delas. Não foi razoável, porém, desrespeitar as relações impostas pela Federação, depois de ter rejeitado os pedidos de renovação que os estados fizeram no passado.

A presidenta Dilma agiu bem ao buscar solução para o sério problema do excessivo custo da energia no Brasil, uma questão complicada que está procurando corrigir, talvez, de uma maneira um pouco mais dura do que seria necessário, mas que precisa ser feita. Espera-se, finalmente, a convocação no segundo semestre de 2013 dos prometidos leilões.
As medidas tomadas no exercício das políticas monetária, fiscal e cambial estão na direção correta. Pode-se discutir a forma, mas elas estão corrigindo, ou tentando corrigir, alguns dos defeitos fundamentais da economia brasileira. Isso contempla desde a bem-sucedida política de queda da taxa de juros real, a recuperação da taxa de câmbio proporcionada pelo controle do movimento de capitais, as desonerações das folhas salariais, e o excepcional esforço para aumentar a inclusão social.

O governo, quando facilita o acesso ao crédito, quando estimula sua expansão, está promovendo o crescimento do consumo, deixando claro que esse modelo ainda tem muito que contribuir para a inclusão social. O que falta agora é um poderoso estímulo ao investimento privado e o restabelecimento de uma relação de confiança entre o governo e o setor privado.

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