terça-feira, 29 de novembro de 2011

Com descaso do governo e falta de verbas para subsistência, Casa do Índio agoniza

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Por Rui Zilnet

Enquanto Eunice Cariry relata os acontecimentos ocorridos
na Casa do Índio, assistidos acompanham com liberdade
Dia desses, em visita à Casa do Índio do Rio de Janeiro, fundada em 1968 pela sertanista Eunice Cariry, para acolher índios portadores de necessidades especiais, fiquei encantado com o que presenciei. A casa, localizada em uma sossegada rua da Ilha do Governador, abriga cerca de 32 índios com problemas físicos, mentais e doenças crônicas, que convivem tranquilamente num prédio com características que lembram uma aldeia indígena, porém, com estrutura adaptada ao meio urbano, proporcionando-lhes o conforto, a higiene e o bem estar necessários à boa recuperação.

Durante o tempo que permaneci na casa, aproximadamente oito horas, os índios assistidos demonstraram felicidade espontânea e aparência saudável, sem apresentar qualquer sinal característico de sofrimento ou privação de qualquer ordem. As instalações são limpas e bem cuidadas.

Segundo Eunice Cariry, o objetivo principal da Casa do Índio é receber índios oriundos das Administrações Regionais da FUNAI, instaladas nos estados da federação, sempre que esgotem todos os recursos para tratamento nos locais de origem. Os assistidos são atendidos na rede hospitalar pública (SUS) e por facultativos, que voluntariamente prestam assistência especifica a cada caso, desde a sua fundação, há 43 anos.

Contudo, desde os anos de 1990 a Casa do Índio passa por um processo de desestruturação promovido pela segmentação do atendimento aos indígenas, que retirou da Funai atribuições que lhes eram da competência. Como exemplo, a Educação dos índios passando para o Ministério da Educação (MEC) e a Saúde, respectivamente, para o Ministério da Saúde.

Cândido Ribeiro é um dos funcionários da Casa do Índio
Eunice destaca que desde a criação da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), em 1999, a Casa do Índio passou a sofrer um processo de cortes nas verbas para manutenção, alimentação e medicamentos dos atendidos, culminando, recentemente, com o cancelamento de um convênio que pagava todos os seus funcionários. Na próxima quarta-feira (30) completam 30 dias que foram rescindidos os contratos de cerca de 14 cuidadores, que mesmo assim permanecem em seus postos, sabendo que poderão ficar sem receber os salários.

A situação da Casa do Índio é extremamente delicada. O estado é de alerta máximo. Com o esfacelamento da Funai, as ações de terrorismo que a casa vem sofrendo, e uma visível disputa de poder por pessoas e instituições sem qualquer comprometimento com a causa indígena, a não ser o oportunismo, os assistidos estão sujeitos a ficarem abandonados à própria sorte, o que ainda não ocorreu devido à dedicação e seriedade que Eunice Cariry dirige a instituição.

O que entristece nesta situação é que enquanto uma organização criada com propósitos essencialmente humanistas, cumprindo verdadeiramente os objetivos a que se propôs é esfacelada pelo descaso das instituições governamentais, elementos aventureiros, pseudoprotetores dos índios, apropriam-se facilmente de recursos públicos, explorando a plasticidade cênica oferecida pelos indígenas, para mostrar belo e ocultar a realidade cruel.

Espera-se que alguém do governo demonstre bom senso e resolva rapidamente esta situação de descaso com a Casa do Índio, reconhecendo que o trabalho conduzido por Eunice Cariry é necessário e eficaz. O que não se pode aceitar é que os índios que ali estão fiquem jogados à própria sorte e os funcionários permaneçam na incerteza de seus futuros. A solução carece ser adotada com urgência máxima.


Texto e fotos de Rui Zilnet 
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sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Jornalismo grotesco e de baixo nível

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Por Priscila Fonseca, em Comunique-se

O jornalista Mino Carta, diretor de redação da Carta Capital, critica o jornalismo atual. “Os jornais brasileiros são muitos feios e mal escritos, sem comparação com as mídias estrangeiras. O jornalismo virou algo grotesco e de baixo nível”, disse Mino, durante debate no Medion 2011, 5º Seminário de Jornalismo Online, realizado nesta quinta-feira (24) em São Paulo. A discussão também contou com o editor executivo da Revista Veja, Fábio Altman. O debate foi mediado pelo psicanalista Jorge Forbes, com o tema, Jornalismo no Divã.

Altman concordou com Mino. “A variedade e o volume de informações é tão grande e é muito mais rico que anos atrás, no entanto, se você não souber absorver o que é realmente de qualidade, fica só lixo. O número de grandes reportagens antes era muito maior e bem feito”.

Mino afirmou que os jovens jornalistas não conhecem o Brasil. “Você precisa ter um nível de conhecimento sobre história do Brasil. Eu fico pasmo em jovens jornalistas não saberem nada sobre isso. E isso me assusta muito, por que temos condições de melhorar”, disse Mino.

Altman completou. “Muitas pessoas nessas condições compram Iphone e Tablets, mas nem se quer leram um livro”.

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quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Governo promete reforçar ações para conter conflitos entre indígenas e fazendeiros no Mato Grosso do Sul

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Por Luana Lourenço, em Agência Brasil

A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, disse hoje (24) que o governo vai reforçar as ações na região de Dourados, em Mato Grosso do Sul, palco de conflitos entre indígenas e produtores rurais. A tensão na região aumentou na última semana depois do ataque de pistoleiros ao Acampamento Tekoha Guaiviry, no município de Amambai.

De acordo com os indígenas, o cacique Nísio Gomes foi morto e três moradores do acampamento foram sequestrados. O corpo do cacique desapareceu e ainda não há pistas sobre os desaparecimentos. A Polícia Federal e o Ministério Público Federal abriram inquérito para investigar o caso.

Na próxima semana, segundo Maria do Rosário, o governo vai reunir o Comitê Gestor de Ações Indígenas Integradas para Dourados em um encontro em Mato Grosso do Sul. O grupo deverá anunciar um pacote de políticas públicas para os cerca de 44 mil índios da região.

“O comitê, que é composto por vários ministérios, estará em reunião em Mato Grosso do Sul exatamente para tratar de questões relacionadas ao atendimento em saúde, de segurança, e um conjunto de politicas para as comunidades indígenas”, adiantou a ministra.

“Os conflitos agrários na região têm desencadeado situações de muita violência, com mortes que poderiam ter sido evitadas. O desafio é asseguramos segurança e direitos humanos às comunidades indígenas e tratar o conflito agrário com definições claras do Estado brasileiro”, acrescentou.

Maria do Rosário disse ainda que é preciso cobrar das autoridades a investigação sobre os mandantes e executores de crimes contra indígenas, comuns na região.

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quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Vinícius Cordeiro é o novo presidente do América

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No exercício interino da presidência desde o afastamento do seu antecessor, o Advogado Vinícius Cordeiro foi eleito na noite de ontem (22) presidente do América Football Club, do Rio de Janeiro, para o triênio 2012/2014. O resultado foi de 85 votos a favor, 10 em branco e 6 nulos, para a chapa encabeçada por Cordeiro, que não teve concorrente.

A votação aconteceu no Teatro Max Nunes, na sede da Rua Campos Sales, na Tijuca. Na ocasião, Vinícius Cordeiro destacou que quando assumiu a presidência interina, foi em meio a um processo de efervescência política no clube, mas, agora, não só a situação do clube está melhor, como também a financeira, social e desportiva. “Trabalhamos muito nos últimos seis meses e hoje temos uma instituição se encaminhando para a recuperação plena”, concluiu.


quinta-feira, 17 de novembro de 2011

PEC do diploma de jornalista volta à pauta do Senado


Agência Senado

Voltou à pauta do Plenário do Senado a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)33/2009 de autoria do senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) que trata da exigência de curso superior de Comunicação Social para o exercício da profissão de jornalista. Para que a matéria seja apreciada, no entanto, é preciso que sejam votadas duas medidas provisórias que trancam a pauta, ou que seja convocada sessão extraordinária.

De acordo com a PEC, nos termos do substitutivo aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), a profissão de jornalista é privativa do portador de diploma do curso superior de Comunicação Social, com habilitação em jornalismo, expedido por instituição oficial de ensino, cujo exercício será definido em lei.

A PEC é uma resposta à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de junho de 2009, que revogou a exigência do diploma para jornalistas. Os ministros consideraram que o Decreto-lei 972 de 1969, que exige o documento, é incompatível com a Constituição, que garante a liberdade de expressão e de comunicação.

A exigência do diploma, de acordo com esse ponto de vista, um resquício da ditadura militar, afastaria dos meios de comunicação intelectuais, políticos e artistas que se opunham ao regime.

O relator do texto na CCJ, senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), objetou que, ao contrário de inibir a liberdade de expressão, a luta pela regulamentação da profissão de jornalista esteve historicamente ligada à defesa da democracia no Brasil.

"O que reprimiu liberdades no período ditatorial não foi a exigência de diploma, mas a censura, o autoritarismo, a perseguição política, o controle ideológico dos meios de comunicação pela intimidação e força do regime militar. A resistência democrática esteve encabeçada por inúmeros jornalistas, e não foi a exigência do diploma que impediu maior ou menor liberdade de expressão", disse o relator.

De acordo com Inácio Arruda, PEC visa resgatar a dignidade profissional dos jornalistas, fixando na própria Constituição que a profissão de jornalista é privativa do portador de diploma de curso superior em jornalismo, sem criar restrições à livre manifestação do pensamento e das informações, garantindo a democracia e a liberdade, pilares do Estado de Direito.

Diploma facultativo
O substitutivo estabelece ainda que a exigência do diploma não é obrigatória ao colaborador, assim entendido aquele que, sem relação de emprego, produz trabalho de natureza técnica, científica ou cultural, relacionado com a sua especialização, para ser divulgado com o nome e qualificação do autor.

A exigência do diploma também não é obrigatória para aquele que, à data da promulgação da emenda, comprove o efetivo exercício da profissão de jornalista, bem com aos jornalistas provisionados que já tenham obtido registro profissional regular perante o órgão competente.

Esforço concentrado
As entidades representativas da categoria dos jornalistas convocaram seus membros para pressionarem os senadores para que a PEC 33/2009 seja votada ainda nesta semana. Em abaixo-assinado, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) diz que aposta na "independência e na vocação democrática do parlamento para reverter uma decisão nitidamente obscurantista do STF, que tem como único objetivo atingir a profissão de jornalista e a sua capacidade de expressar a liberdade de expressão prevista na Constituição".

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Autônomos assinam matérias da Folha após demissão de 40 jornalistas

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Na última semana, 40 jornalistas foram demitidos da Folha de São Paulo, representando enxugamento de 10% da redação do jornal. Entre os demitidos, redatores, repórteres e editores com mais de 20 anos de empresa. As demissões atingiram profissionais dos cadernos de “Classificados”, “Poder” e “Cotidiano”.

O caderno ‘Folhateen’ acabou, passando a ser uma página da “Folha Ilustrada”, e a sucursal da Agência Folha em Cuiabá foi fechada.

Para suprir a lacuna deixada pelas demissões, que atingiram principalmente as editorias de “Cotidiano” e “Ilustrada”, desde segunda-feira (14) grande volume de matérias da Folha estão sendo assinadas por freelancers.

De acordo com informações contidas no Portal Comunique-se, 23 matérias da ‘Folha.com’ foram assinadas por autores autônomos, sendo uma do dia 14 e outra do dia 15; 11 textos no dia 16 e dez textos nesta quinta-feira (17). “Entre o dia 1º e o dia 13 de novembro, não havia nenhuma matéria assinada por colaboradores publicada no site.”

As demissões não atingiram Andreza Matais, José Ernesto Credendio e Catia Seabra, que receberam o “Prêmio Esso de Jornalismo 2011” pela produção da reportagem “O patrimônio e as consultorias que derrubaram Palloci”, publicada pela Folha.



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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Qual será o próximo alvo da Veja?

Por Rui Zilnet


Dia desses foi o ministro dos Esportes. Agora, a carta da vez, marcada pela Veja, é o ministro Carlos Luppi, do Trabalho. Enquanto não vê-lo derrubado não sossegará. É o tudo ou nada panfletário já característico da revista, com investimento pesado na desconstrução moral de pessoas públicas.

Sem entrar no mérito da culpabilidade dos atores envolvidos, a atuação do conhecido veículo da Editora Abril, pela sua forma de atuação, é de perseguição explícita ao atual governo brasileiro. É comportamento político-partidário de uma empresa que não está nem um pouco preocupada com as questões éticas que envolvem o trabalho e a produção jornalística. Isto é muito claro.

Contudo, resta saber por que esta revista não agia da mesma forma no período em que a presidência da República era exercida pelo senhor Fernando Henrique Cardoso e pelos que o antecederam? Por que, também, a Veja não divulga os fatos escabrosos que envolvem o atual governo do Estado de São Paulo?

Após Carlos Lupi, qual será o próximo alvo?

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Ocupação da Rocinha vira "espetáculo midiático"

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Por Luciana Lima, em Agência Brasil

A divulgação massiva das ocupações de comunidades pobres do Rio de Janeiro por forças da segurança púbica remonta, segundo especialistas, à República Velha, quando a hipervalorização dos presos buscava alcançar o reconhecimento da sociedade para o trabalho policial. Segundo Michel Misse, professor de sociologia e antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretor do Núcleo de Estudos em Cidadania, Conflito e Violência Urbana (Necvu) da UFRJ, a pirotecnia fez lembrar artigos da década de 1950 que criticavam a “aliança” entre imprensa e polícia para supervalorizar as prisões.

“O interessante é que são artigos críticos de Silvio Terra, que hoje dá nome à Academia de Polícia do Rio de Janeiro. Desde àquela época já se identificava a tendência de tornar muito mais importante, inteligente e perigoso aqueles que eram capturados pela polícia”, diz Misse. “Era uma forma de hipervalorizar o trabalho [policial]. Desde aquela época, já existia essa aliança entre a polícia e os veículos de comunicação, com suas editorias de polícia.”

A anunciada ocupação das favelas da Rocinha e do Vidigal no Rio de Janeiro domina o noticiário há uma semana. Mesmo antes da madrugada de domingo (13), quando as forças policiais subiram o morro, a prisão dos policiais que tentaram escoltar traficantes em fuga e a captura do traficante Antônio Bonfim Lopes, o Nem, tiveram ampla cobertura da imprensa nacional. O assunto também ganhou destaque internacional, mostrando que o Rio investe para reforçar a segurança para receber dois megaeventos esportivos mundiais: a Copa do Mundo em 2014 e das Olimpíadas de 2016.

Isso já havia ocorrido no primeiros semestre do ano, quando as 13 favelas que formam o Complexo do Alemão, na zona norte do Rio, foram ocupadas por forças da segurança pública. “Essa aliança explica, em parte, a ênfase na divulgação da prisão de Nem, que era um traficante de varejo”, assinala o professor. “O Nem já estava negociando com a Polícia Civil sua rendição. O advogado mantinha contatos com a polícia quando ele resolveu fugir.”

De acordo com Misse, o poder econômico do tráfico no Rio está em declínio e já deu vários sinais. “Um deles foi o acordo feito por facções do Rio com facção de São Paulo. Foi a partir desse momento que o crackcomeçou a entrar no Rio, coisa que antes os traficantes cariocas não permitiam.” O avanço das milícias (organizações formadas a partir da associação entre criminosos e policiais) também demonstra esse enfraquecimento, acrescentou o diretor do Núcleo de Estudos em Cidadania, Conflito e Violência Urbana da UFRJ.

Para Marcelo Burgos, professor e coordenador da área de sociologia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, a forte ação midiática está no centro da política de implantação das unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Segundo ele, o “efeito UPP” tenta vender o conceito de uma cidade “pacificada”. “A UPP é uma política que se diferencia de outras até pelas ações de caráter midiático. O que temos no Rio não é só a UPP, mas também o “efeito UPP.”

Embora ressalte que entende a intenção do governo do Rio em apresentar Nem como um “troféu”, o professor da PUC do Rio vê exagero na cobertura da imprensa. “O interesse da mídia e a repercussão da prisão de um traficante do porte do Nem não é compreensível. Apesar de não ser um pé rapado, de ter domínio territorial [sobre a Favela da Rocinha], de controlar um volume razoável de dinheiro e de mercadoria [droga], não se pode considerá-lo um chefão do tráfico. É claro que houve uma midiatização da prisão dele.”

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terça-feira, 15 de novembro de 2011

Fotografia: Água-Conservação e Cultura

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A água é alma de toda e qualquer paisagem. É o espelho da humanidade. Ela viu a Terra antes da terra. Viu o engatinhar das civilizações. É a mesma desde que o mundo é mundo, renovando-se no ciclo intenso e natural de fazer-se vapor, nuvem, chuva, rio, para depois e sem cessar começar tudo de novo.

A água conhece a história do planeta. E parte da imensidão da história da água está esmiuçada no livro Água-Conservação e Cultura, do fotógrafo Adriano Gambarini e da jornalista Laís Duarte, que será lançado pela Editora Cultura Sub, na próxima quinta-feira (17), das 17 às 20 horas, na Livraria Travessa, Rua 7 de Setembro 54, Centro, Rio de Janeiro. Em duas centenas de páginas tem-se um oceano de informações.

Fotógrafo Adriano Gambarini 
"O convite veio num encontro informal, regado a um pequeno copo de água com gás e uma xícara contendo um líquido escuro, onde uma água cuidadosamente quente acentuava o paladar do café. Meu atraso ao encontro se deu por conta de uma chuva torrencial que complicou o trânsito paulistano. Gotas despretensiosas escorriam pela janela do vidro enquanto o assunto era aprofundado em ideias, imagens e conceitos.

 'Água' era o tema, em toda sua magnitude e subjetividade. Enquanto conversávamos sobre como apresentar informações e imagens de algo tão imaterial e ao mesmo tão essencial para qualquer existência vivente na Terra, milhares de fotografias corriam na minha memória. Ao mesmo tempo em que me perdia na ansiedade de selecionar na lembrança as melhores fotos, num arquivo de mais de 100 mil que acumulei desde 1992, percebia que quase a totalidade deste arquivo tinha alguma relação direta com a água.

Foi então que uma deliciosa percepção me envolveu: ao produzir um livro sobre Água, estaria não apenas sendo cúmplice de gelo, chuva, rios e corredeiras. Estaria produzindo um livro sobre a vida! 

Afinal, o que é a vida sem a água, o que é a água sem sua misteriosa capacidade de se transmutar em diversas formas, e se tornar novamente vida? Não são, nem podem, ser dissociadas. Assim, me sinto honrado em ser parte deste livro, e nada mais nobre do que compartilhar imagens sobre este bem maior, sobre a vida em sua forma mais fluida..." (Adriano Gambarini)

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O terrorismo da mídia e o leitor de boa fé


Por Gilson Caroni Filho*, em Correio do Brasil

O reino dos céus, de acordo com a tradição cristã, será dos homens de boa fé. A eles já pertencem, na sua íntegra, os conteúdos noticiosos do dispositivo midiático nativo. No momento em que a Comissão Européia prevê um forte freio na atividade econômica em 2012 e não descarta a hipótese de uma longa e profunda recessão, editoriais e os conhecidos representantes do jornalismo de mercado pregam como “medidas de cautela contra o contágio” a mesma agenda que quase nos levou ao colapso nos oito anos do consórcio demotucano.

Fingindo ignorar que se rompeu uma coisa que já estava rompida, homens e mulheres de “boa fé,” de prestigiosas redações, voltam a aplicar a estratégia do terrorismo econômico, na expectativa de gerar uma profecia que se auto-cumpre. Enquanto o Banco Central, acertadamente, revê medidas de restrição ao crédito, depois de ter iniciado a redução das taxas de juro em agosto, os oráculos da grande imprensa sonham em ver reinstalada a política fundamentalista que, de 1994 a 2002, implementou radical mecanismo de decadência auto-sustentada, marcada por crescentes dívidas e desemprego, e anemia da atividade econômica.

O Brasil ideal seria aquele com juros elevados, maior dificuldade de financiamento, menor mercado para exportações e a volta a negociações duras com bancos e organismos multilaterais. A nostalgia cega qualquer possibilidade de análise séria. Se a liberdade de imprensa é tanto mais ampla quanto maior for a responsabilidade ética dos que a fazem diariamente, podemos afirmar, ancorados em um razoável número de citações jornalísticas, que só a regulamentação da mídia pode salvar a esfera pública por ela ameaçada.

No capítulo das mentiras complexas que se arrastam há décadas, há que se arremeter com energia demolidora contra o sequestro da moral pública pelos critérios que definem a lógica do mercado. Está em curso uma ação que não tem outro objetivo senão o do esvaziamento da essência da política.

Não há mais como transigir , em nome da diversidade de opiniões, com a velha ortodoxia assimilada pelos jornalões, portais e emissoras de televisão como “exemplo de racionalidade econômica”. O receituário se repete como mantra: liberalização do comércio; ênfase no setor privado como fonte de crescimento, incluindo a privatização de empresas estatais; redução geral de todas as formas de intervenção governamental no mercado de capitais e no câmbio; precarização dos direitos trabalhistas e sucateamento do Estado. Já aprendemos demais com a tragédia para vê-la rediviva como farsa.

Sabemos que a desregulamentação dos mercados financeiros resultou numa explosão da dívida privada, numa especulação nunca vista anteriormente e abusos sórdidos do capital financeiro. O fundamento religioso de mercado está na base do estancamento da economia global e da crise que afeta a zona do Euro. Por que reeditá-lo por aqui? São inocentes os consultores e jornalistas de plantão? Não.

Eles sabem que a repercussão de alguns destes problemas vão bem além da esfera econômica. A capacidade de sobrevivência de governos democráticos como os do Brasil, Argentina, Uruguai, entre tantos outros, frente a contínuas reduções do nível de vida, seria discutível. Das redações o mercado articula o golpe. São insanas as corporações midiáticas? Não, são ávidas de poder, riquezas e inimigas juradas da democracia. O desprezo com que se referem às instituições representativas revela o autoritarismo que embasa sua estrutura discursiva. É preciso dar um basta aos que se inclinam, siderados, a qualquer aventura antidemocrática. A “mão invisível” se move implacável em edições diárias.


* Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Correio do Brasil e do Jornal do Brasil.

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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Folha de São Paulo demite 40 jornalistas

Noticiar que a Folha de São Paulo demitiu cerca de 40 jornalistas desde o último dia 10, com certeza não interessa à mídia conservadora convencional brasileira. Tomei conhecimento do fato através de matéria publicada no Portal Comunique-se, a qual reproduzo abaixo na íntegra.



Por Redação de Comunique-se, em 14/11/2011

Cerca de 40 jornalistas foram demitidos da Folha de São Paulo desde a quinta-feira (10), o que representa o ‘enxugamento’ de 10% da redação do jornal. Além das saídas das dezenas de profissionais, o diário também decidiu acabar com o caderno ‘Folhateen’, voltado para o público jovem, que passa a ser uma página da ‘Ilustrada’.

Redatores, repórteres e editores foram demitidos jornalistas dos cadernos de “Classificados”, “Poder” e “Cotidiano”. Profissionais com mais de 20 anos de empresa também fazem parte da equipe que foi desligada do jornal nesta semana. Na Agência Folha, a mudança foi o fechamento da sucursal de Cuiabá (MT). 

De acordo com o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo (SJ-SP), as demissões da Folha não têm justificativas, pois de acordo com a entidade, o faturamento do Grupo Folha, empresa que controla a Folha de São Paulo e o jornal Agora, tem aumentando nos últimos meses.

Em nota divulgada no site oficial do sindicato, o presidente José Augusto Camargo acusa o jornal de não levar a democracia a sério. “A recusa de negociar as demissões com o Sindicato demonstra o total desrespeito com a entidade e com os jornalistas. No caso da Folha, tal atitude é uma contradição a tão divulgada ‘democracia’ defendida pelo jornal, que na prática é apenas uma estratégia de marketing”.

Procurada pela reportagem do Comunique-se para explicar os motivos das demissões, a direção da Folha de São Paulo não pronunciou até o fechamento desta matéria.

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Alerta de Fidel Castro para a crise mundial


Por Fidel Castro, de Havana, em Correio do Brasil

Sinto-me no dever de transmitir àqueles que se ocupam em ler estas reflexões, o critério de que todos, sem exceção, estamos na obrigação de criar consciência sobre os riscos que a humanidade está correndo de forma inexorável, rumo a uma catástrofe definitiva e total como consequência das decisões irresponsáveis de políticos a quem o acaso, mais que o talento ou o mérito, pôs em suas mãos o destino da humanidade.

Sejam ou não os cidadãos de seu país portadores de uma crença religiosa ou céticos com relação ao tema, nenhum ser humano em seu juízo são, estaria de acordo com que seus filhos, ou familiares mais próximos, pereçam de forma abrupta ou vítimas de atrozes e torturantes sofrimentos.

Depois dos crimes repugnantes que com frequência crescente a Organização do Tratado do Atlântico Norte, sob a égide dos Estados Unidos e dos países mais ricos de Europa vêm cometendo, a atenção mundial se concentrou na reunião do G-20, onde se devia analisar a profunda crise econômica que hoje afeta todas as nações. A opinião internacional, e particularmente a europeia, esperavam resposta à profunda crise econômica que com suas profundas implicações sociais, e inclusive climáticas, ameaçam todos os habitantes do planeta. Nessa reunião se decidia se o euro podia manter-se como a moeda comum da maior parte da Europa, e inclusive se alguns países poderiam permanecer dentro da comunidade.

Não houve resposta nem solução alguma para os problemas mais sérios da economia mundial apesar dos esforços de China, Rússia, Indonésia, África do Sul, Brasil, Argentina e outros de economia emergente, desejosos de cooperar com o resto do mundo na busca de soluções aos graves problemas econômicos que o afetam.

O insólito é que logo que a Otan deu por concluída a operação na Líbia – depois do ataque aéreo que feriu o chefe constitucional desse país, destruiu o veículo que o transportava e o deixou à mercê dos mercenários do império, que o assassinaram e o exibiram como troféu de guerra, ultrajando costumes e tradições muçulmanos – a AIEA, órgão das Nações Unidas, uma instituição que deveria estar a serviço da paz mundial, lançou o informe político, carimbado e sectário, que põe o mundo à beira da guerra com o emprego de armas nucleares que o império ianque, em aliança com a Grã Bretanha e Israel, vem preparando minuciosamente contra o Irã.

Depois do “Veni, vidi, vici” do famoso imperador romano há mais de dois mil anos, traduzido para o “vim, vi e morreu” transmitido à opinião pública através de uma importante rede de televisão logo que se tomou conhecimento da morte de Gaddafi, as palavras são desnecessárias para qualificar a política dos Estados Unidos.

O que importa agora é a necessidade de criar nos povos uma consciência clara do abismo para onde a humanidade está sendo conduzida. Duas vezes nossa Revolução conheceu riscos dramáticos: em outubro de 1962, o mais crítico de todos, em que a humanidade esteve à beira do holocausto nuclear; e em meados de 1987, quando nossas forças enfrentavam as tropas racistas sul-africanas, dotadas com as armas nucleares que os israelenses os ajudaram a criar.

O Xá do Irã também colaborou junto a Israel com o regime racista e fascista sul-africano.

O que é a ONU? – uma organização impulsionada pelos Estados Unidos antes do final da Segunda Guerra Mundial. Essa nação, cujo território estava consideravelmente distante dos cenários de guerra, tinha enriquecido enormemente; acumulou 80% do ouro do mundo e sob a direção de Roosevelt, sincero antifascista, impulsionou o desenvolvimento da arma nuclear que Truman, seu sucessor, oligarca e mediocre, não vacilou em usar contra as cidades indefesas de Hiroshima e Nagasaki no ano de 1945.

O monopólio do ouro mundial em poder dos Estados Unidos e o prestígio de Roosevelt, permitiram o acordo de Bretton Woods que atribuiu aos Estados Unidos o papel de emitir o dólar como única divisa que se utilizou durante anos no comércio mundial, sem outra limitação que seu respaldo em ouro metálico.

Os Estados Unidos, ao finalizar aquela guerra, eram também o único país que possuía a arma nuclear, privilégio que não vacilou em transmitir a seus aliados e membros do Conselho de Segurança: Grã Bretanha e França, as duas mais importantes potências coloniais do mundo naquela época.

À URSS, Truman nem sequer informou uma palavra sobre a arma atômica antes de usá-la. A China, então governada pelo general nacionalista, oligárquico e pró-ianque, Chiang Kai-shek, não podia ser excluída daquele Conselho de Segurança.

A URSS, golpeada duramente pela guerra, a destruição e a perda de mais de 20 milhões de seus filhos pela invasão nazista, consagrou ingentes recursos econômicos, científicos e humanos para equiparar sua capacidade nuclear com a dos Estados Unidos. Quatro anos depois, em 1949, provou sua primeira arma nuclear; a de Hidrogênio, em 1953; e em 1955 seu primeiro megaton. A França dispôs de sua primeira arma nuclear em 1960.

Eram apenas três os países que possuíam a arma nuclear em 1957, quando a ONU, sob a égide ianque, criou a Agência Internacional de Energia Atômica. Alguém imagina que esse instrumento dos Estados Unidos fez algo para advertir o mundo sobre os terríveis riscos a que se exporia a sociedade humana quando Israel, aliado incondicional dos Estados Unidos e da Otan, situado em pleno coração das mais importantes reservas do mundo em petróleo e gás, se constituía em perigosa e agressiva potência nuclear?

Suas forças, em cooperação com as tropas coloniais inglesas e francesas, atacaram Port Said quando Abdel Nasser nacionalizou o Canal de Suez, propiedade da França, o que obrigou o primeiro-ministro soviético a transmitir um ultimato exigindo o cessar daquela agressão, que os aliados europeus dos Estados Unidos não tiveram outra alternativa senão acatar.



Fidel Castro Ruz, ex-presidente de Cuba, é militante do Partido Comunista Cubano.

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segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Mino Carta: “Efeitos da pregação midiática”

Por Mino Carta*, em Carta Capital

No princípio era e é a mídia. A primazia vem de longe, mas se acentua com o efeito combinado de avanço tecnológico e furor reacionário. De início a serviço do poder até confundir-se com o próprio, um poder ainda medieval de muitos pontos de vista, na concepção e nos objetivos.

Ao invocar o golpe de Estado de 1964, os editorialões receitavam o antídoto contra a marcha da subversão, obra de pura fantasia, embora os capitães do mato, perdão, o Exército de ocupação estivesse armado até os dentes. Marcha da subversão nunca houve, sequer chegou a Revolução Francesa.  Em compensação tivemos a Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade.

Há tempo largo a mídia cuida de excitar os herdeiros da Casa-Grande ao sabor de pavores arcaicos agitados por instrumentos cada vez mais sofisticados, enquanto serve à plateia, senzala inclusive instalada no balcão, a péssima educação do Big Brother e Companhia. Nem todos os herdeiros se reconhecem como tais, amiúde por simples ignorância, todos porém, conscientes e nem tanto, mostram se afoitos, sem a percepção do seu papel, em ocasiões como esta vivida pelo presidente mais popular do Brasil, o ex-metalúrgico Lula doente. E o estímulo parte, transparentemente, das senhas, consignas, clichês veiculados por editorialões, colunonas, artigões, comentariões.

Celebrada colunista da Folha de S.Paulo escreve que Lula agora parece “pinto no lixo”, cuida de sublinhar que “quimioterapia é dureza” e que vantagens para o enfermo existem, por exemplo, “parar de tomar os seus goles”. Outra colunista do mesmo jornal, dada a cobrir tertúlias variadas dos herdeiros da Casa-Grande, pergunta de sobrolho erguido quem paga o tratamento de Lula. Em conversa na Rádio CBN, mais uma colunista afirma a culpa de Lula, “abuso da fala, tabagismo, alcoolismo”. A cobra do Paraíso Terrestre desceu da árvore do Bem e do Mal e espalhou seu veneno pelos séculos dos séculos.

Às costas destas miúdas aleivosias, todas as tentativas pregressas de denegrir um presidente que se elegeu e reelegeu nos braços do povo identificado como o igual capaz de empenhar-se pela inclusão de camadas crescentes da população na área do consumo e de praticar pela primeira vez na história do País uma política externa independente. Trata-se de fatos conhecidos até pelo mundo mineral e no entanto contestados oito anos a fio pela mídia nativa. E agora assistimos ao destampatório da velhacaria proporcionado pelo anonimato dos navegantes da internet, a repetirem, já no auge do ódio de classe, as tradicionais acusações e insinuações midiáticas.

Há uma conexão evidente entre as malignidades extraordinárias assacadas das moitas da internet e os comportamentos useiros do jornalismo do Brasil, único país apresentado como democrático e civilizado onde, não me canso de repetir, os profissionais chamam o patrão de colega.

Por direito divino, está claro. E neste domínio da covardia e da raiva burguesotas a saraivada de insultos no calão dos botecos do arrabalde mistura-se ao desfraldado regozijo pela doença do grande desafeto. Há mesmo quem candidate Lula às chamas do inferno, em companhia dos inevitáveis Fidel e Chávez, como se estes fossem os amigões que Lula convidaria para uma derradeira aventura.

Os herdeiros da Casa-Grande até mesmo agora se negam a enxergar o ex-presidente como o cidadão e o indivíduo que sempre foi, ou são incapazes de uma análise isenta, sobra, de todo modo, uma personagem inventada, figura talhada para a ficção do absurdo. De certa maneira, a escolha da versão chega a ser mais grave do que a própria, sistemática falta de reconhecimento dos méritos de um presidente da República decisivo como Lula foi. Um divisor de águas, acima até das intenções e dos feitos, pela simples presença, com sua imagem, em toda a complexidade, a representar o Brasil em tão perfeita coincidência.


* Mino Carta é diretor de redação de CartaCapital. Fundou as revistas Quatro Rodas, Veja e CartaCapital. Foi diretor de Redação das revistas Senhor e IstoÉ. Criou a Edição de Esportes do jornal O Estado de S. Paulo, criou e dirigiu o Jornal da Tarde.


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Mais um profissional de imprensa vítima da guerra urbana no Rio


Por Milton Corrêa da Costa*, em Correio do Brasil

O cinegrafista da TV Bandeirantes Gelson Domingos da Silva, de 46 anos, foi morto na manhã deste domingo, na guerra sem fim do Rio, enquanto participava da cobertura de uma operação do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e do Batalhão de Choque na Favela de Antares, Zona Oeste da cidade. Foi atingido com um tiro de fuzil na região do tórax. Na ocasião o profissional de imprensa, segundo a TV Bandeirantes, fazia uso de colete à prova de bala. A Associação Profissional dos Repórteres Fotográficos e Cinematográficos do Rio (Arfoc-Rio) divulgou nota dizendo que “este é mais um capítulo da trágica história da cidade, que nos deixa consternados e preocupados com o seu futuro e o da profissão”.

Oito marginais foram presos e quatro pessoas mortas durante a intervenção policial. Entre os presos, estão o “gerente” do tráfico local, conhecido comoBBC e seu braço-direito China. Também em nota, a Polícia Militar lamentou a morte de Gilson e afirmou que o objetivo da ação era checar informações da área de Inteligência do Bope e do Batalhão de Choque de que líderes do tráfico fortemente armados se reuniam no local, sendo a fração de tropa (cerca de 100 homens) sido recebida naquele momento a tiros de fuzil e metralhadoras pelos meliantes.

Não, não se trata de uma ficção, nem relato de correspondente de guerra. Este é o retrato fiel de uma guerra sem fim, que se arrasta (cotidianamente) por quase vinte anos e que vitima e aterroriza gregos e troianos, apesar de todo esforço das autoridades e seus agentes na tentativa de pacificação de morros e favelas do Rio, conhecidos redutos do narcoterrorismo. Na ação policial foram apreendidos um fuzil AR-15, três pistolas, cinco rádios transmissores, 1kg de maconha, 574 trouxinhas de maconha, 522 pedras de crack, 100 papelotes de cocaína, R$ 3.154,00 e nove motocicletas.

Tal relato nos leva a refletir sobre o risco da função que exercem repórteres e cinegrafistas na guerra do Rio. A missão de repórteres e cinegrafistas que cobrem, in loco, a Guerra do Rio, é mais arriscada hoje do que a própria missão de correspondentes que atuam no front das guerras como a do Iraque e a do Afeganistão. Não há dúvida. Na permanente guerra do Rio os confrontos de policiais com traficantes ou entre facções criminosas, dispondo de armas de guerra altamente letais, inclusive granadas, são a curta e média distâncias.

Somente o uso de coletes à prova de bala e capacetes de aço já não são mais mecanismos de proteção suficientes para jornalistas na perigosa missão. Táticas de progressão segura no terreno, em locais de difícil acesso e de abrigo, também precisam ser aprendidas e incorporadas no adestramento de tais profissionais, postados na linha de tiro, quanto mais quando se tem uma câmera e outros equipamentos na mão que precisam ser usados e transportados. No Iraque e no Afeganistão normalmente os confrontos são a longa distância, através de mísseis de guerra de longo alcance, onde os correspondentes de guerra permanecem abrigados e as cenas de confronto são colhidas via aérea. Lá também os atentados terroristas são em locais incertos. Situação diferente da modalidade de guerra urbana desenvolvida no Rio.

A guerra do Rio é, portanto, muito mais perigosa e expõe a risco iminente de vida policiais e jornalistas. É preciso também detectar de que forma, após 20 anos de intensos embates, continuam adentrando, em morros e favelas do Rio, possantes armas de guerra. A inteligência policial precisa dar uma resposta a tal questionamento. Pelo visto, a difícil missão de pacificação do Rio está longe do fim.

Por sua vez, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro (SJPMRJ) vê com indignação a morte de Gelson Domingos. É mais uma morte que resultou da falta de segurança em coberturas de risco no Rio de Janeiro. Para o Sindicato, este fato expõe a ‘imediata necessidade de dar continuidade às ações de proteção que foram prioridade após a morte de Tim Lopes e que hoje estão sendo proteladas pelo Sindicato Patronal’

Também neste ano, em maio, a direção do Sindicato dos Jornalistas pediu em Brasília o apoio da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal para a aprovação de leis que possam garantir segurança mais efetiva aos jornalistas que trabalham em áreas de risco. O pedido foi feito durante audiência pública realizada em homenagem ao Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.

Ao Sindicato das Empresas, foi proposta ainda em 2009 a idéia de criar em cada redação uma Comissão Paritária de Segurança, composta por profissionais do jornalismo, justamente para avaliar as operações em áreas de risco. Porém, este pedido foi constantemente negado sob a alegação de interferência nas redações. ‘A lógica dos patrões é fazer com que o emprego dos profissionais, como repórteres cinematográficos por exemplo, esteja garantido apenas à medida em que o trabalhador se arrisque cada vez mais em situações como essas’, expõe Suzana Blass.

A estrutura dada aos profissionais é pífia já no item mais básico: o colete à prova de balas. O Sindicato dos Jornalistas já havia alertado os veículos e exigiu que o material fosse analisado por especialistas do setor. Um repórter de televisão que estava próximo a Gelson Domingos durante a operação na manhã deste domingo e foi até a UPA acompanhar o corpo, confirma: ‘Estes coletes são lixo, são de papel.’‘Trata-se de uma tragédia que não podemos deixar que volte a acontecer’, afirma Suzana Blass.


* Milton Corrêa da Costa é coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro.

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sábado, 5 de novembro de 2011

Mídia conservadora brasileira X corrupção


Por Marcos Coimbra, em Carta Capital

Em uma das passagens mais conhecidas de Alice no País das Maravilhas, a heroína entabula um diálogo com a Falsa Tartaruga, um ser melancólico, sempre triste por ter deixado de ser uma tartaruga de verdade.

A alturas tantas, a tartaruga relembra os dias na escola e as matérias que estudara: “Reler e escrevinhar, é claro (…) e os diferentes ramos da aritmética: Ambição, Distração, Enfeiamento e Escárnio”. Quando a menina lhe pede que explique o que quer dizer o terceiro, ela responde: “Você sabe o que é embelezar, imagino (…) então você sabe o que é enfeiar”.

A mídia conservadora brasileira é uma espécie de Falsa Tartaruga. Ela não hesita no emprego de sua peculiar aritmética de enfeiar, confundir e escarnecer.
Sua proeza mais recente é a fabricação de uma conta sobre o tamanho da corrupção no Brasil, seguida de sua difusão maciça. Faz como ensinava um famoso propagandista alemão: para transformar uma mentira em verdade, é preciso repeti-la mil vezes.

Hoje, ela fala em 85 bilhões de reais anuais, como se pode ver na capa da principal revista da direita nativa. Ontem, eram 70 bilhões. Amanhã, sabe-se lá. E não importa. O relevante é trombetear uma cifra que impressione, qualquer que ela seja.

A mídia conservadora pega o número e o põe nas manchetes, na boca de comentaristas televisivos, em suas “análises”. Ficam todos compungidos com o tamanho do pro-blema. Como se não fosse ela mesma que lhe deu a dimensão que tanto a assusta.

Tudo começou com a divulgação de um estudo do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp, que tinha a intenção de estimar os “custos econômicos da corrupção” no Brasil. Como passou a ser referência, vale a pena entender o que fizeram seus autores.

Seu ponto de partida foi usar de forma questionável algo banal, os estudos sobre percepção de corrupção, que perguntam a determinado público se acha que ela existe e se seria grande ou pequena. Como as respostas decorrem de impressões, o resultado, óbvio, é subjetivo.

Se, por exemplo, a mídia estiver falando muito do assunto, os entrevistados podem imaginar que a corrupção aumentou, sem que tenha crescido um só milímetro objetivamente. Vice-versa, podem achar que diminui enquanto cresce.

O que o estudo da Fiesp fez de mais condenável foi usar uma medida de percepção da corrupção para inferir seu custo real. Inovaram, fazendo algo que, mundo afora, ninguém faz.

Um problema adicional da metodologia é a fragilidade de suas bases de dados. Para chegar à “corrupção percebida”, a fonte são avaliações de técnicos -estrangeiros (vinculados, tipicamente, a empresas de cálculo de risco), somadas a alguns poucos e modestos estudos com empresários brasileiros. Exemplificando: o Fórum Econômico Mundial faz, em média, 98 entrevistas por país; o Institute for Management Development, 83. Qualquer um vê que seu tamanho é insuficiente.

São pesquisas que usam questionários autorrespondidos, o que as complica ainda mais. Quando a Transparência Brasil quis fazer algo parecido, convidou 4 mil empresas, mas obteve apenas 76 respostas. Como imaginar que essas 0,019% sejam representativas, se foram só elas que quiseram participar?

Os técnicos da Fiesp utilizaram o Índice de Percepção da Corrupção (IPC), calcula-do pela Transparência Internacional para 180 países, e resolveram inventar (verificaram que o Brasil melhorou de 1996 para 2009, mas preferiram deixar isso de lado).

O IPC brasileiro, em 2009, era 3,7 (em uma escala que chega a 10, que significa zero de corrupção percebida). E se nosso índice fosse maior, se a percepção fosse menor?
Mas quanto? Talvez achando que suas especulações pareceriam mais “científicas”, escolheram 12 países a esmo para calcular seu IPC médio. Ficaram, sabe-se lá por que, com Coreia do Sul, Costa Rica, Japão, Chile, Espanha, Irlanda, Estados Unidos, Alemanha, Austrália, Canadá, Cingapura e Finlândia.

Se a corrupção percebida no Brasil fosse igual (por alguma razão misteriosa) à média desses países, nosso IPC iria para 7,45. E daí? Iria para menos se substituíssemos a Finlândia pela Holanda, “mais corrupta”. Para mais, se trocássemos a Espanha pela Eslovênia, “menos corrupta”. E daí?

Daí vem a prestidigitação do estudo da Fiesp. Tomaram um modelo neoclássico de crescimento econômico e resolveram torná-lo “sensível ao índice de percepção da corrupção”. Para isso se deram ao direito de modificar o modelo (sem dizer como) para “incluir os efeitos da corrupção sobre o crescimento de longo prazo do produto per capita” (embora continuassem a falar, somente, de percepções).

Se, então, nosso IPC fosse 7,45 e se o modelo que inventaram fosse verdadeiro, o produto per capita brasileiro seria 1,36% maior ao ano, entre 1990 e 2008. Como o IPC real é menor, teria havido, nessa lógica estranha, um “prejuízo” (o “custo da corrupção”) de 41,5 bilhões de reais anuais.

E se o IPC brasileiro fosse 10? Se ne-nhum dos empresários ouvidos achasse que há qualquer tipo de corrupção no Brasil? Se fôssemos o único país do mundo com esse índice (melhor que o da Dinamarca, o “menos corrupto”)?

Aí o “prejuízo” de ter o IPC de 3,7 seria maior. Chegaria a 69,1 bilhões de reais anuais (a preços de 2008), que nossa mídia arredondou para 70 bilhões.

E assim se explicam os números que andam por aí: pesquisas limitadas, metodologias discutíveis, inferências sem fundamento. Eles não dizem simplesmente nada.

Se alguém quiser um exemplo melhor da aritmética da Falsa Tartaruga, vai ter trabalho. Faz tempo que não vemos uma discussão tão sem pé nem cabeça.

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