Fórum divulga relatório sobre violações a direitos nas obras para megaeventos
Falta de informações, truculência, indenizações insuficientes e impedimento à participação popular. O "Relatório de Violações de Direitos e Reivindicações”, um dossiê de 46 páginas produzido recentemente pelo Fórum Comunitário do Porto, relata os problemas enfrentados pelas comunidades da zona portuária da cidade brasileira do Rio de Janeiro.
Os conflitos acontecem por conta das obras para os megaeventos que ocorrerão no Brasil – Copa do Mundo de Futebol (2014) e Olimpíadas (2016). Na Zona Portuária, a Lei Complementar n˚ 101/2009 cria o projeto Porto Maravilha, em que uma área de 5 milhões de metros quadrados será gerida por uma parceria público-privada – a maior do país – sob o argumento de trazer investimentos financeiros e alavancar o turismo no local.
Apesar de a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal ter publicado, em abril deste ano, recomendação para minimizar os impactos sociais negativos com as obras de infraestrutura para os megaeventos, o relatório ressalta a gravidade das violações sofridas principalmente no Morro da Providência, na Rua do Livramento e, nesta mesma rua, na Ocupação Machado de Assis.
Os moradores relatam violações graves ao direito à informação. "Contrária a esse direito, as intervenções tanto da Prefeitura quanto as do Consórcio Porto Novo 2 têm sido fragmentadas e desconectadas, o que dificulta o entendimento dos moradores quanto ao projeto, seu real objetivo e sua forma de execução”, afirma o dossiê.
Somado a isso, está a abordagem "imprevista e truculenta” dos técnicos da prefeitura e do consórcio. Há depoimentos de que alguns deles se negam a apresentar o crachá ou a fornecer qualquer informação requerida pelos moradores. Em outros casos, os agentes fazem cadastros que dizem ser para outro objetivo e quando os moradores se dão conta, suas casas já estão pichadas com spray, marcadas para remoção. Só no Morro da Providência, o Fórum Comunitário estima que há entre 300 e 400 residências ameaçadas.
"[O agente estava identificado?] ‘Não, tava com o crachá virado e as informações não foram claras porque eles falaram que vieram cadastrar e quando passou alguns dias eles vieram pra cá com marreta, caminhão, pra desmontar tudo, quebrar tudo e botar todo mundo pra rua’”, conta um morador da Rua do Livramento.
Para pressionar a rápida tomada de decisões, sem deixar tempo para mobilização coletiva, a Prefeitura, por meio da Secretaria Municipal de Habitação (SMH), impõe prazo de 15 dias para que as famílias escolham entre duas opções. A primeira é o aluguel social (R$400,00) até que sejam reassentadas no conjunto habitacional do projeto Minha Casa Minha Vida em Senador Camará, o que, de acordo com o relatório, infringe a lei orgânica do município que garante a todos o reassentamento num raio de 500 metros de local de origem.
A segunda opção seria receber a indenização da Prefeitura, que não leva em conta o valor do terreno e, por isso, se torna muito baixa, impedindo a aquisição de outro imóvel.
Outra grave violação é a falta de participação popular na criação do projeto, como recomendado pela Procuradoria Federal. "O que a Prefeitura considera como participação popular costuma reduzir-se à realização de reuniões que, na realidade, são apenas apresentações de projetos e não amplos espaços de debate para a construção desses projetos”, critica o relatório.
Repercussão
O "Relatório de Violações de Direitos e Reivindicações” foi apresentado em 21 de junho, durante audiência pública sobre violações de direitos humanos no Rio de Janeiro. Segundo a arquiteta e urbanista Rossana Brandão, que participou da elaboração do documento, a procuradora da República, Gisele Porto, se comprometeu a analisar as denúncias do dossiê e pedir um Termo de Ajuste de Conduta, além de ressarcimento de danos aos moradores.
Para Rossana, é importante que o Ministério Público Federal consiga coibir as ações da Prefeitura do Rio com instrumentos jurídicos. Outra estratégia interessante na garantia dos direitos dos moradores seria a adoção da resolução da Procuradoria como diretrizes. "Que, caso sejam descumpridas, haja enquadramento como violações”, explicou.
Além dos impactos sociais, de que trata o relatório, Rossana destaca os impactos negativos que o projeto Porto Maravilha terá sobre a paisagem urbana e o patrimônio material e imaterial do local.
"Ali há casas que existem há mais de 200 anos; o Morro da Providência é a 1ª favela do Rio de Janeiro, as pessoas que moram ali são descendentes de escravos, tem grupos de samba que são referência. A Prefeitura quer criar "cenário para inglês ver, o que eles chamam de revitalização é criar uma vida que não é a vida que tem ali, gerar uma riqueza, no local, que não é para aquela população que mora ali”, declara.
Para ler o documento na íntegra, acesse: http://www.fase.org.br/UserFiles/1/File/RELAT%C3%B3RIO%20MPF%20FCP.pdf
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